Devir é um conceito da Filosofia e denomina transformação intensa da vida, a partir dos encontros que construímos. Inspirados por este conceito, oferecemos nosso espaço e nosso trabalho para que possamos produzir transformações, as quais sejam por uma vida alegre, criativa e engajada social, política, ecológica e eticamente.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

As pessoas voltam a Tahrir: provocações sobre os protestos pelo Brasil


(texto apressado enquanto passagem provisória e inacabada)

Ar fresco produzido por bombas de fumaça e balas de borracha. Corpos modelados pela pujança da massa que se espreme nos coletivos (nem sempre devires).  Agora, remodelados pelas bordoadas dos policiais. Algo a mais acontece por aqui!


Os protestos são apartidários (então - e só assim - legítimos). Se há articulação com partidos políticos, ela ocorre de modo autônomo e independente, mas ainda sim referendado e determinado pela insatisfação popular. Oposição e situação, desanimai-vos!

Os valores e os aumentos das tarifas do transporte coletivo são apenas catalisadores e disparadores para a revolta popular (talvez um elemento derradeiro para o desencadeamento da onda de protestos). Tal revolta não traduz apenas uma insatisfação com as condições de vida (acesso aos bens e serviços básicos a manutenção da sociedade), mas também faz referência, mesmo que de forma indireta, à insatisfação com o próprio funcionamento estatal no Brasil (indignação com a classe política-eleitoreira, corrupção, máquina estatal onerosa, ostentosa e pouco eficiente e etc). É o estopim.



A energia revolucionária é jovem ou pueril, mas não carrega uma ingenuidade infantilizada e nem reduzida no sentido de se fazer referência a uma determinada faixa etária. É jovem enquanto potência que demanda o novo e, mais que demandar, intenta em produzir o novo, superando a acomodação em velhos valores e atitudes, destituída do medo da bota do Estado – por isso estando a mercê de sentir o seu peso. 
Os protestos tem um caráter peculiar, pois assinala para uma ruptura do paradigma comportamental do brasileiro. Os conflitos diretos com a política revelam que há uma progressiva superação da passividade que é historicamente confundida com pacificidade. O Brasil tem a fama de ser um país pacífico, o que não é de todo o mal, quando essa pacificidade não se revela uma absoluta passividade e inércia. 
A dita violência é oriunda de encontro abrupto um fluxo de produção desejante e uma parede dura, um espaço estriado, uma força oposta ao vetor revolucionário do desejo (força que intenta a manutenção plena do status quo). A violência nada mais é do que o encontro de duas forças opostas ou o encontro de duas forças vetoriais em sentidos ou orientações diversas... É o corte. É a lógica da fálica-falida da castração se tentando fazer atuante no âmbito social. Nessa perspectiva não cabe justificar, legitimar ou não a violência, porque ela escapa do registro moral, talvez se faça melhor discutida a partir de um espectro ético (imanente).   Assim, quem sabe repensemos que violentou quem, visto que o Estado guarda para si o direito de exercer a violência, monopolizando-a... 



Existem algumas críticas em relação a pouca definição e sistematização da pauta de reinvindicação. No entanto, como já dito, o MOTIVO disparador da reivindicação é apenas um estopim, a potência revolucionária está na MOTIVAÇÃO (palavras de meu velho amigo Max de Carvalho), ou seja, no próprio ato de protestar, de insurgir e se levantar contra uma lógica hegemônica que se faz presentificar por meio de suas pequenas com-formações microfascistas (abuso de poder da polícia, valor aviltante da passagem de ônibus, redução da maioridade penal, internação compulsória, exploração e precarização do trabalhado, copa do mundo). O que está para ser dito no protesto, já está dito no próprio ato de protestar. 
A pauta então seria a demonstração do poder popular? Ainda sim se adotarmos essa pauta, de viés altamente e inegavelmente produtivo, ainda é um estofo. A grande questão problemática ainda estaria localizada na necessidade de se definir e saber qual a definição da pauta das manifestações. O importante de saber nesse caso é que tudo isso é algo que não é tangível pelo crivo do saber e não carece de ser, é pura intensidade, diferença. O que passa pela lógica simbólica identitária é paulatinamente atropelado. 
Quando passam a demandar sentido lógico para o protesto e para qualquer atitude que tenha algum resquício de revolucionária, o mais próximo de uma resposta seria: o sentido que rege, é o sentido do desejo. Elas tomam as ruas, no fim das contas, porque assim desejam. E o que desejam afinal?
O desejo não tem objeto... ou melhor, o objeto sempre é parcial...e o desejo não deseja nada além de sua realização e para isso só se reafirma enquanto potência por meio da produção do novo, nesse caso, por meio de dispositivos coletivos...
Agenciamentos desejantes SEMPRE são revolucionários, ou ganham essa roupagem por si só, porque esse fluxo desejante sempre encontra em seu caminho a parede (ou a bota) dura. 
O evento ou o acontecimento não é o protesto, mas sim o que ele gera nas pessoas - afetações que nos fazem ir as ruas, nos mobiliza para escrever, conversar, brigar com a polícia  e acima de tudo promove um ponto de viragem. 
Desse modo, escapará mesmo do espectro da racionalidade pura e realmente deve escapar para ser de fato inventivo, pois a própria lógica da racionalidade dominante deve ser colocada em xeque. É um levante que ainda se manifesta enquanto PRODUÇÃO inconsciente, manifestando-se enquanto engajamento consciente. Quando se tenta e quando enfim, sistematizam algo, ou conseguem aquilo que estão reivindicando ou simplesmente são capazes de avaliar se pelo o que estão lutando vale mesmo a pena, (quando qualquer uma dessas coisas acontecer e irá acontecer), o levante perderá naturalmente intensidade. Então é estabelecido um novo estado de coisas. Para mim, isso pouco importa, importa mesmo é o processo: a constituição anárquica momentânea, a zona autônoma temporária, a autogestão criada que será o momento de transpassagem e de criação de singularidade... o evento (como disse meu chegado Bruno Costa)...  o evento não é o que isso vai repercutir enquanto mortificação legalista ou juridicista, mas a linha de fuga e a afetação – evento ou horizonte de eventos (roubando e subvertendo o conceito caro à física moderna). 



Não importa o que será feito no dia seguinte, como se perguntaria Zizek. No áspero e enrijecido Dia Seguinte as pessoas não retornariam a praça Tahrir no Egito, após derrubar seu presidente, ou não insistiriam em se manter em Wall Street. Afinal, o que elas querem afinal, o que desejam? Simplesmente desejam!
Talvez uma rebeldia sem causa de minha parte! Mas só há rebeldia sem haver uma causa, ou quando se toma todas às outras, ou talvez tomando a própria rebeldia como causa.
O dia seguinte já estará atravessado por aquilo que aconteceu no entre, por essa Utopia Ativa e a Estética da (R)existência!!!!
Ficam algumas breves provocações...

Por Pedro Costa e alguns interlocutores pelo caminho...